Haydee Svab:”Transparência permite fiscalização mais eficiente de recursos públicos”

Haydee Svab:”Transparência permite fiscalização mais eficiente de recursos públicos”
Haydee lidera a Open Knowledge Brasil em iniciativas que visam facilitar o acesso da sociedade civil a dados abertos, como o projeto “Querido Diário”/Divulgação
Publicado em 30/10/2024 às 2:01

Luciano Teixeira – São Paulo

A Open Knowledge Brasil (OKBR) é uma organização da sociedade civil que há uma década trabalha para expandir a transparência de dados públicos no Brasil, com foco no desenvolvimento de tecnologias acessíveis e ferramentas de monitoramento. Uma das suas principais iniciativas é o projeto “Querido Diário”, que busca transformar o conteúdo dos diários oficiais municipais em dados abertos e acessíveis. Esse projeto é especialmente relevante em um contexto de carência de transparência nos atos do governo em nível local, onde a ausência de padronização e de acessibilidade aos dados dificultam a fiscalização e o controle social.

À frente da OKBR, Haydée Svab, engenheira e especialista em dados, acredita que a informação é fundamental para a construção de uma sociedade democrática e transparente. Com mais de dez anos de experiência em projetos que unem tecnologia e políticas públicas, ela lidera a OKBR em iniciativas que visam facilitar o acesso da sociedade civil a dados abertos. O “Querido Diário” é uma dessas iniciativas, usando tecnologia para extrair e organizar informações dos diários oficiais, que muitas vezes estão disponíveis apenas em formatos de difícil acesso, como PDFs ou imagens, o que dificulta a análise.

O projeto, que já abrange centenas de municípios, inclui a criação de uma plataforma onde os dados municipais podem ser consultados de forma simples e visual, e ainda uma API aberta, permitindo a integração dos dados com outras aplicações. Esse tipo de tecnologia proporciona à sociedade e a jornalistas uma nova forma de monitoramento, facilitando a busca por informações como licitações, contratações e despesas municipais, com potencial para identificar irregularidades ou práticas de improbidade administrativa.

A visão de Haydée é que o conhecimento livre permite decisões mais assertivas e éticas, tanto por parte dos cidadãos quanto dos gestores públicos. Para ela, a transparência dos dados, impulsionada pelo “Querido Diário” e por outras ferramentas, representa um avanço significativo para o controle social e para o fortalecimento das instituições democráticas.

Confira a seguir a entrevista com Haydée Svab, diretora-executiva da Open Knowledge Brasil, que aborda os desafios e os avanços no uso da inteligência artificial para o aprimoramento da transparência pública no Brasil.

Luciano Teixeira: Como funciona o trabalho da Open Knowledge Brasil no país? Como vocês atuam para promover a transparência e a inteligência artificial?

Haydee Svab: A Open Knowledge Brasil é uma organização da sociedade civil. Fazemos parte de uma rede internacional que promove o conhecimento livre e a transparência pública. Nossas iniciativas vão desde capacitação, com a Escola de Dados, até pesquisas e o desenvolvimento de tecnologias cívicas. Trabalhamos para fortalecer o entendimento sobre dados, algoritmos, e como tudo isso impacta a sociedade. Estamos comprometidos em promover a transparência e o acesso aos dados. Acreditamos que isso fortalece a sociedade e permite uma fiscalização mais eficiente dos recursos públicos.

Luciano Teixeira: Quais projetos vocês têm atualmente?

Haydee Svab: Temos vários projetos, entre eles o monitoramento da abertura de dados nas capitais brasileiras e a avaliação da qualidade desses dados. Outro exemplo é o “Querido Diário”, um projeto que usa inteligência artificial para coletar e estruturar informações publicadas nos diários oficiais municipais, facilitando o acesso a dados que, em muitos casos, estão disponíveis apenas em formato de imagem ou PDF.

Luciano Teixeira: Como está a qualidade dos dados públicos abertos no Brasil?

Haydee Svab: No âmbito federal, temos uma estrutura relativamente boa, mas, à medida que os dados se descentralizam para os níveis estaduais e municipais, a transparência diminui. Muitos municípios não têm recursos ou estruturas adequadas para manter dados abertos e acessíveis, o que limita a transparência e o monitoramento de políticas públicas na ponta.

Luciano Teixeira: E por que há essa falta de transparência nos municípios?

Haydee Svab: Às vezes, o problema é a falta de estrutura para coletar e publicar dados de maneira organizada. Em alguns casos, a informação simplesmente não existe ou não é priorizada. Isso prejudica tanto a fiscalização pela sociedade quanto a elaboração de políticas públicas baseadas em dados.

Luciano Teixeira: A inteligência artificial tem ajudado vocês a aprimorar o trabalho?

Haydee Svab: Sim, a IA nos ajuda a otimizar a coleta e análise de dados. Por exemplo, ela nos permite classificar diferentes tipos de arquivos ou organizar dados de municípios com estruturas variadas. Embora não usemos IA generativa, nossa equipe desenvolve raspadores e algoritmos que facilitam a automação de processos.

Luciano Teixeira: Quais os desafios específicos que vocês enfrentam ao trabalhar com IA?

Haydee Svab: A IA comete erros, então é importante ter parâmetros claros para avaliar os resultados e assegurar que o modelo esteja funcionando conforme o esperado. Também é essencial que mantenhamos um olhar crítico sobre os dados que estamos interpretando, garantindo que as informações geradas sejam precisas e úteis.

Luciano Teixeira: Como a falta de dados impacta o setor jurídico e a atuação de advogados?

Haydee Svab: A ausência de dados abertos dificulta o trabalho dos advogados e da sociedade civil. A transparência nos diários oficiais, por exemplo, facilitaria o acesso à legislação e a normas específicas, o que é crucial para a democracia e o exercício do direito. No passado, o acesso a esses documentos era limitado e hoje está muito mais acessível, mas ainda há muito a ser feito.

Luciano Teixeira: Vocês conseguem monitorar casos de improbidade administrativa com os dados coletados?

Haydee Svab: Nosso papel é fornecer a ferramenta e os dados para que jornalistas e pesquisadores possam fazer esse tipo de análise. Um exemplo prático é o monitoramento de compras públicas para entender como as cidades estão implementando políticas de segurança, como a aquisição de armas para guardas municipais, ou de tecnologia de reconhecimento facial nas escolas.

Luciano Teixeira: Como o cidadão comum e advogados podem se beneficiar do trabalho da Open Knowledge?

Haydee Svab: Recomendamos que experimentem a plataforma “Querido Diário” para explorar temas de interesse. Já temos uma versão voltada para o meio ambiente, onde é possível receber alertas sobre temas específicos. Estamos sempre abertos a parcerias e sugestões para expandir o uso dessa tecnologia.

Luciano Teixeira: E sobre o uso das emendas do orçamento secreto? Como vocês abordam essa questão?

Haydee Svab: Ainda não temos um projeto estruturado sobre isso, mas estamos atentos. Participamos de conselhos de transparência e advocamos por maior clareza nos dados federais, estaduais e municipais para que a sociedade consiga monitorar essas verbas de maneira eficiente.

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