Fernando Parro: “IA nos permite focar no que realmente importa: o desenvolvimento jurídico e a criatividade”

Fernando Parro: “IA nos permite focar no que realmente importa: o desenvolvimento jurídico e a criatividade”
"Estamos apenas começando a explorar o potencial da inteligência artificial na advocacia, mas já vemos resultados que ampliam nosso tempo para tarefas estratégicas e complexas."/Divulgação
Publicado em 08/11/2024 às 2:01

Luciano Teixeira – São Paulo

A implantação de inteligência artificial no Nelson Wilians Advogados, liderada por Fernando Parro, trouxe uma transformação significativa, principalmente no que diz respeito ao trabalho com grandes volumes de dados e nas operações de contencioso repetitivo. O sócio e diretor do escritório é especialista em compliance e proteção de dados, o que o torna uma referência na gestão e otimização de operações jurídicas complexas. Ele destaca como a IA tem auxiliado na construção de defesas, no preenchimento de formulários e na análise de subsídios de forma mais eficiente. Com isso, a tecnologia permite ao escritório redirecionar a mão de obra para atividades mais estratégicas, como o desenvolvimento de teses jurídicas e a análise detalhada de documentos. 

Parro acredita que, no futuro, as ferramentas de IA não substituirão os advogados, mas ampliarão suas capacidades, permitindo uma análise mais profunda e um acompanhamento mais personalizado dos casos. Na entrevista a seguir, ele explora os desafios e as conquistas do uso de IA, detalhando as transformações que a tecnologia tem trazido ao escritório e sua visão para o futuro.

Luciano Teixeira: Gostaria de começar falando sobre a introdução de inteligência artificial no Nelson Wilians Advogados. Esse processo enfrentou resistência? Como foi a implantação e o impacto nas condições de trabalho?

Fernando Parro: Na verdade, ao contrário do que se pode imaginar, nunca houve resistência a mudanças no nosso escritório. Sempre buscamos estar na vanguarda da aplicação de tecnologia, mas durante muito tempo as soluções que nos eram apresentadas não tinham o nível de entrega e eficácia que desejávamos. Portanto, demoramos um pouco para investir pesado na inteligência artificial. Nos últimos dois anos, vimos um amadurecimento das ferramentas e, finalmente, decidimos investir em uma equipe dedicada e em recursos para implementar a IA de forma robusta no escritório.

Luciano Teixeira: O que foi esse “salto de entrega” que motivou a equipe a investir na tecnologia?

Fernando Parro: O principal foi conseguir resultados que se assemelhassem aos produzidos por nossa equipe, especialmente nas atividades mais repetitivas, como a construção de defesas mais simples, preenchimento de formulários e análise de subsídios. Queríamos automatizar algumas rotinas como cadastro, solicitação de subsídio e atendimento às decisões judiciais para facilitar o entendimento do cliente. Muitas vezes, precisamos adaptar a linguagem jurídica para uma comunicação mais acessível e estamos treinando a IA para isso, algo que antes era exclusivamente feito por nossos advogados.

Luciano Teixeira: Isso resultou em otimização de trabalho e aumento de eficiência?

Fernando Parro: Sim, mas ainda estamos no começo. Nosso objetivo não é necessariamente reduzir a equipe, mas fazer um uso mais inteligente do tempo e da expertise dos advogados. Em vez de gastar horas em tarefas repetitivas, o advogado pode focar em atividades mais estratégicas e criativas, como o desenvolvimento de teses e a produção de peças jurídicas. A IA já ajuda a compilar e analisar os subsídios fornecidos pelos clientes, o que permite que o advogado dedique mais tempo ao conteúdo jurídico em si.

Luciano Teixeira: Como você vê a influência da inteligência artificial no futuro do mercado jurídico?

Fernando Parro: Ainda é difícil prever exatamente como isso se desenrolará, mas já vemos o surgimento de novas funções, como profissionais especializados em treinar a IA para entender padrões de comportamento e tomar decisões mais precisas. Esses advogados não necessariamente produzem peças processuais, mas utilizam seu conhecimento jurídico para ensinar a IA, capacitando-a para identificar e processar informações de maneira autônoma.

Luciano Teixeira: Em uma conversa recente com Natasha Oliveira, uma das responsáveis pela implantação da IA no STF, ela mencionou o objetivo de integrar todos os tribunais nos próximos cinco anos. Como vocês enxergam essa possibilidade e o que muda na atuação dos escritórios, facilita como?

Fernando Parro: Eu diria que é um sonho para qualquer advogado ter um sistema integrado entre todos os tribunais, o que facilitaria muito o acesso e o processamento de informações. Hoje, lidamos com vários sistemas de processos digitais e essa falta de integração gera ineficiência. Embora essa integração total seja ambiciosa, acho que é um caminho necessário. A possibilidade de termos sistemas judiciais que dialogam entre si, sugerindo precedentes e otimizando a gestão de casos, é realmente promissora.

Luciano Teixeira: Como está a implantação da IA dentro do escritório, como está o avanço dessa tecnologia em suas operações?

Fernando Parro: Estamos em um processo gradual, dividido em etapas, com foco inicial em atividades como subsídios, defesas de menor complexidade e cálculos. Queremos avaliar a capacidade da IA em diferentes cenários e, no próximo estágio, esperamos expandir o uso da tecnologia em todas as nossas operações jurídicas. É um projeto ambicioso, mas com muito potencial para transformar nossa forma de trabalhar.

Luciano Teixeira: E quanto ao futuro? Qual seria o próximo passo?

Fernando Parro: Há ainda muito a explorar. O que implementamos até agora é apenas o começo, uma etapa inicial perto do que pode ser feito. Acredito que há bastante espaço para crescer e muitas áreas a serem desenvolvidas no campo jurídico com o uso de IA.

Luciano Teixeira: Quais são os principais desafios que vocês enfrentam?

Fernando Parro: Produções mais complexas, que envolvem muitas variáveis, ainda são um grande desafio. Por exemplo, a análise de documentos processuais em grande escala e a identificação de fraudes demandam uma capacidade técnica e tecnológica elevada. Recentemente, conseguimos usar IA para detectar padrões de fraude em comprovantes de residência em uma auditoria para um cliente, algo que seria inviável sem o auxílio da tecnologia.

Luciano Teixeira: Se pudéssemos traçar um paralelo, quem era o Fernando antes da implementação desses sistemas e quem ele é agora?

Fernando Parro: O uso da tecnologia me trouxe uma nova perspectiva, uma curiosidade. Sempre tive uma conexão com tecnologia por conta do meu histórico familiar e da influência de minha mãe, que trabalhava com soluções de internet. Isso me guiou até o campo jurídico. Hoje, vejo o quanto essa inovação facilita o cotidiano e permite que nosso foco esteja no trabalho intelectual. Grande parte do tempo administrativo que gastávamos hoje é otimizado, dando espaço para que os advogados se dediquem mais ao desenvolvimento de trabalhos jurídicos complexos e intelectualmente desafiadores.

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