Decisão do TRF-3 reduz quase a metade da tributação dos créditos de descarbonização

Decisão do TRF-3 reduz quase a metade da tributação dos créditos de descarbonização
Cerca de R$ 370 milhões em créditos, decorrentes da aplicação de alíquota menor, poderiam ser revisados em eventuais discussões judiciais futuras/Pixabay
Publicado em 26/11/2024 às 11:22

O Tribunal Regional Federal da 3ª Região entendeu que as receitas decorrentes da venda de Créditos de Descarbonização (CBIOs) possuem natureza de receita financeira. A decisão reduz a carga tributária na venda de CBIOs e incentiva o uso do instrumento financeiro. Os CBIOs formam a espinha dorsal da estratégia brasileira de transição para uma matriz energética mais limpa no setor de transportes. Cada CBIO equivale a uma tonelada de gases de efeito estufa não emitida na atmosfera devido ao uso de biocombustíveis em vez de combustíveis fósseis.

O tribunal definiu receita financeira como qualquer receita que não decorre diretamente da atividade principal da empresa. A análise envolveu uma usina produtora de biocombustíveis de cana-de-açúcar. Os CBIOs foram classificados como “instrumento registrado de forma escritural, para fins de comprovação da meta individual do distribuidor de combustíveis”, destacando que os ganhos com CBIOs não estão diretamente ligados à atividade operacional das usinas.

“O impacto tributário é significativo: a tributação de PIS/Cofins sobre receitas financeiras é de 4,65%, praticamente a metade das receitas operacionais, tributadas com alíquota de 9,25%. Ou seja, com a alíquota reduzida, empresas do setor podem recuperar valores indevidamente recolhidos em períodos anteriores e, para os próximos períodos, tributar essas receitas com uma carga fiscal reduzida”, afirma Fernando Lima, coordenador de atualizações estratégicas do escritório Simões Pires.

Segundo Sérgio Grama Lima, tributarista do Leite Tosto e Barros Advogados, a Terceira Turma do TRF-3 analisou a questão de forma muito detalhada, colocando como ponto fulcral a efetiva natureza jurídica dos CBIOs, e é justamente essa a questão sensível à tributação dos créditos de descarbonização e/ou os créditos de carbono, haja vista a falta/clareza de definição legal. 

“Com isso, levando-se em consideração as razões do precedente do Tribunal Regional, é completamente justificada a tributação da venda de CBIOS como receitas financeiras para fins de PIS/Cofins não cumulativo, tomando por base a regulamentação até então existente, principalmente, definida pela CVM”, diz. 

João Vitor Prado Bilharinho, tributarista no Diamantino Advogados Associados, explica que o entendimento está alinhado às políticas ambientais do cenário nacional e internacional, no sentido de impulsionar e incentivar o uso de biocombustíveis com a atribuição de alíquotas reduzidas de PIS/COFINS, estando de acordo inclusive com o Acordo de Paris, no qual o Brasil é signatário. “Essa vitória dos contribuintes garante uma maior segurança jurídica às empresas que utilizam da venda de créditos de CBIOs em suas operações, ao passo que convalida as disposições legislativas sobre o assunto, bem como, cumpre a agenda verde do país”, afirma .

A decisão, que ainda não passou pelo crivo dos tribunais superiores, vale por ora apenas para a empresa que moveu a ação. No entanto, ela abre um precedente que poderá ser observado por outras empresas do setor de biocombustíveis. O título completou 5 anos em outubro último e estima-se que cerca de R$ 370 milhões em créditos, decorrentes da alteração da natureza da receita e da aplicação de alíquota menor, poderiam ser revisados em eventuais discussões judiciais futuras.

Segundo Ana Chagas, sócia o Simões Pires na área de ambiental, mudanças climáticas e ESG, a importância do CBIO para o Brasil vai além da questão tributária. “Como principal instrumento do RenovaBio, ele tem como objetivo incentivar a descarbonização da matriz de transporte, contribuindo diretamente para o compromisso do país com o Acordo de Paris”, analisa.

A tributação elevada sobre os CBIOs poderia prejudicar a competitividade e a atratividade deste instrumento, que é essencial para viabilizar a transição energética e o gradual phase out dos combustíveis fósseis. Decisões como a do TRF3 são, portanto, fundamentais para manter o CBIO alinhado ao seu propósito original de incentivo ambiental e para assegurar que o Brasil continue avançando na agenda climática global.

Cerca de 144 milhões de toneladas de gases de efeito estufa deixaram de ser emitidas desde 2019, quando os CBIOs entraram em circulação, o que equivale à captura de CO2 por cerca de 1 bilhão de árvores.

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