Impeachment na Coreia do Sul: as implicações jurídicas e políticas da destituição do presidente Yoon Suk Yeol
O presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk Yeol, foi afastado do cargo neste sábado (14) após o parlamento do país aprovar um pedido de impeachment contra ele. A decisão veio dias depois de Yoon ter decretado e revogado, em poucas horas, uma lei marcial que limitava liberdades civis e dava poderes ampliados ao governo. A medida gerou intensas críticas, protestos populares e um acirramento da crise política que já vinha se aprofundando nos últimos meses.
Com a destituição, o primeiro-ministro Han Duck Soo assume a presidência de forma interina, enquanto o Tribunal Constitucional analisa o processo e decide, em até seis meses, se confirma ou rejeita o impeachment. Durante este período, Yoon está proibido de exercer qualquer função oficial e de deixar o país.
A votação, realizada na madrugada de sábado, contou com 300 deputados presentes. A aprovação do impeachment exigia um mínimo de 200 votos favoráveis, e o resultado final registrou 204 votos a favor, 85 contra, três abstenções e oito votos inválidos. O Partido Democrático, maior força da oposição, liderou a mobilização para garantir o apoio necessário, incluindo votos de parlamentares do partido governista, o Partido do Poder Popular (PPP).
A votação ocorre em meio a uma crise de popularidade do presidente, cuja aprovação caiu para 11%, segundo pesquisas recentes. Deputados da oposição e críticos do governo argumentaram que a decretação da lei marcial por Yoon constituiu um abuso de poder e uma violação dos limites constitucionais.
A lei marcial e suas consequências
A crise que culminou no impeachment teve como ponto central a decretação de uma lei marcial no início de dezembro. A medida, prevista na Constituição sul-coreana para situações de emergência, permite que o governo substitua as leis civis por normas militares e assuma maior controle sobre instituições como a mídia e o parlamento.
Yoon justificou a ação alegando a necessidade de proteger o país contra supostas ameaças de aliados da Coreia do Norte infiltrados em território sul-coreano. No entanto, a decisão foi amplamente criticada por parlamentares e juristas, que consideraram o decreto desproporcional e inadequado para o contexto político do país.
Poucas horas após a implementação, a Assembleia Nacional aprovou uma moção invalidando a lei marcial, e Yoon, diante da pressão, revogou o decreto. Apesar disso, o episódio gerou protestos populares em várias cidades do país, com milhares de manifestantes pedindo sua renúncia.
Os fundamentos jurídicos do impeachment
O pedido de impeachment apresentado pela oposição argumenta que o presidente violou a Constituição ao decretar a lei marcial sem uma justificativa sólida, comprometendo os princípios do Estado Democrático de Direito. A Constituição sul-coreana permite a adoção de medidas excepcionais, mas exige que sejam proporcionais à gravidade da situação e compatíveis com os direitos fundamentais dos cidadãos.
Outro ponto destacado foi a falta de consulta prévia ao parlamento antes da decretação da medida, um requisito previsto na legislação sul-coreana. Esse elemento pesou na decisão dos parlamentares, que consideraram a ação uma afronta à separação de poderes e um desrespeito ao papel fiscalizador do Legislativo.
O Tribunal Constitucional, que agora analisa o caso, terá que avaliar se as ações de Yoon configuraram abuso de poder e violação dos princípios constitucionais. A decisão final depende do voto favorável de pelo menos seis dos nove juízes que compõem a Corte, embora atualmente três cadeiras estejam vagas, o que pode atrasar o julgamento.
O impacto político do impeachment
A destituição de Yoon aprofunda a polarização política na Coreia do Sul e levanta questionamentos sobre a estabilidade do governo interino liderado por Han Duck Soo. O primeiro-ministro terá a missão de garantir a continuidade administrativa do país enquanto a decisão final não é tomada.
Caso o impeachment seja confirmado pelo Tribunal Constitucional, a Coreia do Sul terá que convocar novas eleições presidenciais em até 60 dias. Esse cenário abre espaço para o fortalecimento da oposição, liderada pelo Partido Democrático, que já controla a maioria no parlamento.
Por outro lado, a aprovação do impeachment pode enfraquecer o Partido do Poder Popular, que enfrenta divisões internas desde a decretação da lei marcial. Parlamentares do partido governista foram pressionados pela oposição e por movimentos sociais a apoiar o impeachment, o que expôs fissuras na base de apoio a Yoon.
Antecedentes e trajetória política de Yoon Suk Yeol
Yoon Suk Yeol foi eleito presidente em maio de 2022, representando o Partido do Poder Popular, com uma margem de vitória inferior a 1%. Antes de ingressar na política, Yoon era promotor público e ganhou notoriedade por liderar investigações contra casos de corrupção de alto perfil, o que lhe rendeu apoio popular na época.
No entanto, desde o início de seu mandato, Yoon enfrentou desafios para consolidar sua liderança. Promessas de campanha, como reduzir os custos de moradia e combater o desemprego entre os jovens, não foram cumpridas de maneira eficaz. Além disso, acusações de corrupção envolvendo membros do governo e familiares do presidente abalaram sua imagem.
A crise política se intensificou em 2024, quando o Partido Democrático conquistou uma ampla maioria no parlamento nas eleições legislativas de abril. Desde então, a oposição tem utilizado sua força na Assembleia Nacional para bloquear iniciativas do governo e avançar com investigações contra o presidente.
O impeachment ocorre em um momento delicado para a Coreia do Sul, que enfrenta desafios econômicos como inflação elevada, aumento do custo de vida e tensões comerciais com países vizinhos. O governo interino precisará lidar com essas questões enquanto o processo no Tribunal Constitucional se desenrola.
Além disso, a destituição de Yoon pode ter implicações na política externa do país, especialmente nas relações com os Estados Unidos e a China. A Coreia do Sul é um aliado estratégico dos EUA na Ásia, mas também mantém laços econômicos significativos com a China, o que exige uma política externa equilibrada.
Com o impeachment aprovado, o foco agora se volta para o Tribunal Constitucional, que terá que decidir se confirma ou não a destituição do presidente. Enquanto isso, o governo interino liderado por Han Duck Soo terá que assegurar a continuidade administrativa e trabalhar para estabilizar o cenário político.
Se o Tribunal confirmar o impeachment, uma nova eleição presidencial será convocada, e o país terá a oportunidade de escolher um novo líder para enfrentar os desafios internos e externos. Caso contrário, Yoon poderá reassumir o cargo, embora sua capacidade de governar esteja severamente comprometida após os eventos recentes.
O desfecho do processo será um marco na história política da Coreia do Sul e terá implicações significativas para a democracia do país, que enfrenta mais um teste em um momento de grande turbulência.