Trabalho escravo no Brasil: O desafio de romper o ciclo da exploração

Trabalho escravo no Brasil: O desafio de romper o ciclo da exploração
Dados do MPT mostram que, até 2023, 63 mil pessoas foram resgatadas/Ministério Público do Trabalho - Divulgação
Publicado em 03/02/2025 às 7:54

Da redação de LexLegal

O combate ao trabalho escravo no Brasil, após três décadas de fiscalização, exige uma mudança de abordagem. O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) reconhece que, para erradicar de forma definitiva a exploração de mão de obra em condições análogas à escravidão, são necessárias ações estruturais que vão além da fiscalização tradicional.

Em 2024, o Brasil registrou 2.004 trabalhadores resgatados em condições degradantes. Surpreendentemente, o setor com mais resgates foi o da construção civil, com 293 casos, representando 14,6% do total. Historicamente, o trabalho escravo era associado a atividades rurais, mas o cenário está mudando, refletindo a urbanização da exploração laboral, segundos os especialistas.

“A fiscalização funciona, mas não é suficiente para erradicar o trabalho escravo. Precisamos focar na prevenção”, destaca o procurador Luciano Aragão Santos, do Ministério Público do Trabalho (MPT). Ele ressalta que a coleta e análise de dados são essenciais para identificar vulnerabilidades e orientar políticas públicas.

Dados do MPT mostram que, até 2023, 63 mil pessoas foram resgatadas. Dessas, 17,1 mil não estavam inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais (CadÚnico), o que evidencia a falta de integração entre as ações de resgate e o suporte social pós-resgate.

Vulnerabilidades estruturais

A advogada Laíssa Pollyana do Carmo, da Confederação Nacional dos Trabalhadores Assalariados e Assalariadas Rurais (Contar), destaca que 60% dos 4 milhões de trabalhadores assalariados rurais no Brasil estão na informalidade. Em estados como Bahia, Maranhão e Piauí, a taxa chega a 80%.

Esses trabalhadores, em sua maioria, têm empregos temporários e moram em áreas rurais ou periferias urbanas, com acesso limitado à educação e serviços públicos. Cerca de 11% são analfabetos, e 24% não concluíram o ensino fundamental.

Natália Suzuki, da ONG Repórter Brasil, aponta uma mudança nas rotas da mão de obra escravizada: “Se antes o fluxo era do Maranhão para o Pará, agora vemos um deslocamento da Bahia para Minas Gerais, especialmente para lavouras de café”, diz. Ela enfatiza a necessidade de políticas públicas dinâmicas, capazes de se adaptar rapidamente às mudanças no padrão da exploração.

O combate ao trabalho escravo também passa pela responsabilização das empresas. Laíssa Pollyana defende o monitoramento rigoroso das cadeias produtivas: “Os trabalhadores mais vulneráveis estão em setores lucrativos e exportadores, como a pecuária e as lavouras de café e soja”, afirma.

Para Luciano Aragão, as grandes indústrias precisam monitorar seus fornecedores e não apenas romper contratos após escândalos. “É necessário implementar medidas preventivas e buscar a reparação dos danos causados”, avalia.

O MTE propõe uma abordagem integrada, que combine fiscalização, educação, assistência social e acesso ao trabalho digno. “Sem um sistema assistencial adequado, o ciclo da exploração continua. Políticas públicas tímidas e subfinanciadas não dão conta do problema”, analisa Xavier Plassat, da Comissão Pastoral da Terra.

O fim do trabalho escravo no Brasil exige uma transformação profunda, com políticas públicas eficazes, compromisso do setor privado e participação ativa da sociedade civil.

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