DeepSeek segue as exigências da LGPD?
Da redação de LexLegal
Nos últimos anos, a inteligência artificial generativa tem revolucionado o setor tecnológico, impulsionando inovações e levantando questionamentos sobre privacidade e segurança de dados. No centro desse debate, a DeepSeek, uma startup chinesa que surge como concorrente direta do ChatGPT da OpenAI, tem atraído atenção tanto pelo seu potencial quanto pelas incertezas regulatórias que a cercam.
A empresa, que desenvolveu um chatbot baseado em código aberto, permite que usuários rodem suas próprias instâncias do modelo, o que, por um lado, oferece maior controle sobre os dados processados, mas, por outro, levanta dúvidas sobre conformidade com legislações de proteção de dados, como a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) no Brasil e o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR) na Europa.
A China tem historicamente sido alvo de críticas quanto à transparência no tratamento de informações sensíveis por parte de suas empresas. O caso mais emblemático foi o do TikTok, que enfrentou investigações e proibições em vários países sob a suspeita de que seus dados poderiam ser acessados pelo governo chinês.
Agora, a DeepSeek enfrenta questionamentos semelhantes: até que ponto seus dados estão protegidos e qual o risco de que possam ser compartilhados com autoridades chinesas? A questão central é se a plataforma atende às exigências regulatórias internacionais e brasileiras, especialmente no que diz respeito ao consentimento de usuários, transparência na coleta e armazenamento de informações.
Diferente do ChatGPT, que pertence à OpenAI, empresa sediada nos Estados Unidos e sujeita às regulamentações ocidentais de privacidade, a DeepSeek se posiciona como uma alternativa em código aberto, permitindo que desenvolvedores configurem sua própria versão localmente. Essa flexibilidade pode ser uma vantagem para empresas que desejam maior segurança de dados, sem que informações sensíveis sejam enviadas para servidores externos.
No entanto, a ausência de opções claras para que usuários regulares optem por não compartilhar seus dados para treinamento da IA gera preocupações quanto à transparência e ao cumprimento das normas de proteção de dados.
O advogado Alexander Coelho, sócio do Godke Advogados e especialista em Direito Digital, alerta para a falta de clareza sobre a conformidade da DeepSeek com as regras da LGPD e do GDPR. “No entanto, considerando o histórico de transparência limitado de empresas chinesas no que diz respeito à coleta e processamento de dados, há razões para preocupação”, afirma Coelho.
Luiz Fernando Plastino, advogado do Barcellos Tucunduva Advogados (BTLAW) e especialista em Direito de Informática, observa que os termos de uso da DeepSeek são semelhantes aos de outras plataformas, como o ChatGPT. “É necessário o envio dos dados para que sejam feitas as perguntas para a máquina, de forma que ela possa computar o que vai ler para responder”, explica Plastino.
Uma diferença crítica apontada pelos especialistas é que a DeepSeek, ao contrário do ChatGPT, não oferece uma opção clara para que os usuários optem por não compartilhar seus dados com a plataforma. Plastino destaca, no entanto, que por ser um modelo de código aberto, a IA pode ser rodada localmente, o que representa uma vantagem em termos de segurança de dados. “Nesse caso, se você roda sua instância separada, ele é ainda mais seguro do que um ChatGPT, porque ele não vai enviar dados para fora”, pontua o advogado.
O debate sobre a DeepSeek levanta questões mais amplas sobre o papel da Autoridade Nacional de Proteção de Dados (ANPD) na regulação de novas tecnologias no Brasil. Para Coelho, a entidade precisará ter um posicionamento mais rígido sobre o tema.
“O Brasil vai precisar ser mais proativo na regulamentação e fiscalização de novas tecnologias, especialmente quando envolvem inteligência artificial e o processamento de grandes volumes de dados pessoais. A ANPD deve monitorar a DeepSeek para avaliar se a plataforma segue os princípios da LGPD, especialmente no que diz respeito ao consentimento dos usuários, minimização da coleta de dados e restrições de compartilhamento internacional”, diz.
Plastino avalia que a China não deve ser automaticamente tratada como uma ameaça adicional no contexto da privacidade digital, mas sim como um ator relevante no cenário da IA. “Não me parece que seja uma preocupação adicional simplesmente por vir do governo da China, país que o Brasil sempre manteve relações amigáveis, tanto quanto com outros países produtores de inteligência artificial. Talvez seja uma ideia interessante, na verdade, a própria ANPD avaliar esse modelo de forma mais próxima, justamente porque o código é aberto e, com isso, é possível aprender e ter alguns insights aplicáveis para outros códigos”, conclui.
O futuro da DeepSeek no Brasil dependerá, portanto, da capacidade das autoridades regulatórias em acompanhar os avanços da IA e garantir que essas tecnologias operem dentro dos padrões estabelecidos pela LGPD. Enquanto isso, a disputa pelo mercado de chatbots segue acirrada, com DeepSeek e ChatGPT competindo não apenas pela preferência dos usuários, mas também pela confiança das autoridades globais de proteção de dados.